Aproximo-me. Dou mais um trago no vinho tinto que mandei vir e que se dilui no veludo escarlate das cortinas da carruagem bar onde estou sentada. Sozinha. O álcool apazigua-me os sentidos e adormece-me a ansiedade. Não sei há quantas horas estou ali… com o olhar fixo nas cortinas que parecem falar comigo. Apetece-me a nicotina de mais um cigarro por companhia. Não fumar, são as ordens do letreiro. Retiro-me do bar por breves instantes para me aconchegar num cigarro. Cá fora está frio e o céu cinzento. A lua… cheia de expectativas intermitentes. Olho o mar com alguma relutância. Volto ao bar. Sinto um cansaço na mente. Na mesa ao lado um homem sorri para mim e ergue o copo em tom de brinde. Olho-o com desinteresse. Vou à casa de banho, preciso molhar o rosto para refrescar os taninos.
Olho-me ao espelho uma vez mais. Reflectido, um tigre branco, enorme, acossado. Apetece-me fugir de mim. Será que baralhei os comprimidos? O médico foi muito específico: “Não misture o Azul com o Vermelho, percebeu? No dia em que tomar o Azul, não toma o Vermelho e vice-versa, entendido?”
Terei baralhado tudo? As vozes… voltaram. Os risos… sempre os risos. É de mim que se riem, tenho a certeza que é de mim que se riem. Esfrego os olhos e sinto rímel entrar-me pela retina dentro. “Calem-se! Calem-se!” Mas eles não se calam e riem ainda mais alto. Dou um murro no espelho e sinto um salpico quente no rosto.
Pegas-me na mão, que beijas com descarada sedução. “Onde estamos?”, pergunto meio zonza.
Pões-me um dedo nos lábios: “Shhhhh! É segredo. É um segredo só nosso.”
A tua língua percorre o meu pulso ensanguentado e a tua saliva penetra na minha corrente sanguínea com a força de mil escorpiões. Cerro os lábios e contenho o grito.
“Vem…”
TO BE CONTINUED...
TO BE CONTINUED...
Hedonê
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